O silêncio como refúgio, a música como companheira.

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Orçamento Municipal: Dotações de Segurança e Cidadania

O Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas de Santa Catarina, em conjunto com a Escola do Legislativo Catarinense, sensibilizado pela mobilização da sociedade em torno do debate que visa estabelecer uma política de estado para segurança pública, realizou uma conferência entre gestores e outros agentes públicos para contribuir com o planejamento de soluções e a mudança de paradigmas que envolvem essa função governamental e que, hodiernamente, constitui-se em uma das maiores preocupações do país.

O resultado dos trabalhos dos conferencistas – dentre eles, técnicos do TCE/SC e do MPTC – foi encaminhado ao Ministério da Justiça, para ser considerado quando da elaboração de princípios e diretrizes da política nacional pretendida pela 1a Conferência Nacional sobre Segurança Pública. No entanto, a conclusão de que a efetivação do direito fundamental à segurança, expresso constitucionalmente, passa pela garantia isonômica de cidadania e que esta deve estar resguardada já nos orçamentos das administrações públicas, chamou a atenção para o ponto de onde o agente público deve partir.

As administrações municipais focadas em uma gestão pró-ativa precisam atentar para a proposição de leis orçamentárias sistêmicas, que contemplem programas transversais de políticas públicas de prevenção da violência e da criminalidade, que são complementares às políticas sociais. A discussão prévia pelos atores sociais que sofrerão diretamente sua ação, conforme dispõe a Seção dos Orçamentos da Constituição Federal, e a aplicação efetiva dos recursos financeiros nelas previstos potencializam as chances de reverter a crescente exclusão social, considerado fator preponderante no agravamento do quadro em epígrafe.

A partir de uma análise criteriosa das leis orçamentárias dos entes que lhe prestam contas, os órgãos de controle externo desempenham um papel fundamental nesse campo árido que antecede a execução orçamentária e que concorre para revestir de legalidade os atos administrativos de gestão. É preciso que a análise aponte, também, quais as responsabilidades do gestor advindas dos resultados traçados pela lei orçamentária e quais as responsabilizações vindouras nela encerradas por eventuais omissões.

Não é incomum observar administrações que tratam seus orçamentos meramente como peça de alocação de receitas e despesas em suas unidades de governo, relativas a um período fiscal, para cumprir os dispositivos constitucionais que determinam sua feitura. O gestor que não percebe o orçamento-programa como resultado de um planejamento coerente, estabelecido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias, fundamentada, por sua vez, no Plano Plurianual, despreza sua qualidade de instrumento estratégico.

Ao aprovar leis orçamentárias precárias, basicamente transcrições majoradas de exercícios anteriores, esquece o legislador que o orçamento deve promover isonomia entre os cidadãos e distribuir oportunidades para aquela parcela da população sem condições de satisfazer suas necessidades básicas com saúde e educação, por exemplo, e para a qual deve proporcionar alternativas para obtenção de renda e dignidade. Um orçamento-programa bem elaborado e que extrapola a lógica contábil estimula o fim da cultura do improviso e da reatividade, que pode estar arraigada no seio de quem deveria prever e prover as necessidades de cidadania.

Para atingir essas finalidades, é preciso efetuar um diagnóstico dos problemas públicos que devem ser enfrentados, graduados por importância – os fatos midiáticos constituem a exceção do cotidiano de qualquer município, que se encontra repleto de necessidades não satisfeitas. Esse processo é temporal e demanda monitoramento e atualização constantes, inclusive para adequação crítica de prioridades e urgências, que podem exigir esforços concentrados. Através da análise criteriosa das informações, é possível encontrar subsídios e diretrizes que concorram para a correção gradativa dos problemas apontados, alguns, inclusive, podendo ser retificados prontamente, sem necessidade de prévia autorização legislativa.

A ouvidoria no município, articulada com o setor responsável pelo planejamento orçamentário, pode colaborar com o processo ao considerar sugestões e reclamações recebidas dos munícipes como informações para aquele diagnóstico.

A implementação de políticas públicas ineficazes, negligentes, alienadas das necessidades de sua população e descompromissadas com a salvaguarda dos direitos fundamentais do cidadão, configura uma das formas de violência estrutural que repercute tacitamente na potencialização de outras modalidades de violências. A propósito, leis orçamentárias devem encerrar ações para coibir a mais perversa dessas manifestações institucionais, a corrupção, que agrava sobremaneira as desigualdades sociais. De fato, os elos mais vulneráveis da sociedade acabam sofrendo as consequências da violência estrutural com mais intensidade.

Orçamentos visionários, aqueles que atendem ao requisito da sustentabilidade, com previsão de políticas públicas e de governo que conduzam as comunidades para uma maior justiça e paz sociais, menor índice de diferenças econômicas e com garantias de que gerações futuras possam usufruir dos recursos ambientais recebidos (e gerados) por elas, estão credenciados a fomentar e sedimentar o novo paradigma de construção da dignidade da pessoa humana, que reconhece em cada cidadão a plenitude do significado que a palavra encerra.